Todo dia no mesmo horário, ele sentava na mesma mesa, pedia um café e não tomava. Após uns 5 minutos, levantava e ia embora. Após seis meses resolvi perguntar para ele o porquê daquele ritual. Ele me disse que estava esperando a mulher da sua vida, mas ela ainda não havia aparecido.
Mais uns dois meses se passaram e ele repetia fielmente o rito, sempre no mesmo horário, na mesma mesa, todos os dias. Até que em um dos dias algo inesperado aconteceu. Uma moça, muito bonita, sentou-se ao seu lado. Eles conversaram por alguns instantes e em seguida saíram sorridentes.
Depois disso, ele não mais voltou ao café.
Mais ou menos uns dois anos depois eu o encontrei mendigando pela rua. Ele estava sujo e mal cheiroso, barba e cabelo por fazer. Não lembrava em nada aquele homem altivo e elegante que frequentava o café.
Surpreso em vê-lo naquele estado, me dirigi até ele e perguntei: O sr. não é aquele frequentador do Café Veneza? Aquele que aparecia por lá todos os dias no mesmo horário, ficava uns cinco minutos e depois saía? O que aconteceu com o Sr.?
— Meu rapaz, pague-me uma bebida que eu lhe conto.
Entramos em um bar e eu pedi duas cervejas. Por onde começar, suspirou ele, e continuou.
— Eu tive um sonho e nesse sonho eu estava sentado tomando uma xícara de café no Veneza. Uma moça aparecia, nos olhávamos e foi amor à primeira vista. Contudo, após sairmos do Café ela me disse que não poderíamos ficar juntos, pois se isso acontecesse seria a minha ruína.
Parou por um instante, perdeu um pouco o raciocínio, mas logo continuou.
— Acordei e não pude mais parar de pensar naquela moça, dia após dia pensava nela, estava obcecado. Então lembrei que, em meu sonho, o relógio do Veneza marcava 10:15, instantes antes de vê-la entrar no Café.
Sua feição mudara, parecia viver o momento.
— A partir daí passei a frequentar o local diariamente no mesmo horário para ver se meu sonho se realizava. Finalmente quando se realizou, a profecia não tardou a ser cumprida, em menos de seis meses eu estava em desgraça.
Deu mais um gole na bebida, contemplou a rua através da janela de vidro do bar e avançou em seu relato.
— Numa manhã de sábado, enquanto ela fazia compras na padaria, próximo de casa, um assalto mal sucedido tirou a sua vida. Ela estava no local errado, na hora errada.
Seus olhos lacrimejam e ele dá um longo e silencioso suspiro.
— Não consegui superar a perda e a minha vida desandou. Perdi meu emprego, me endividei, fui despejado e por fim virei morador de rua. Ainda tem a depressão e outros problemas psicológicos que sofro. Como ela disse em meu sonho, tê-la seria a minha ruína e foi isso que aconteceu.
Com os olhos procurei consolá-lo.
— Nem sei porque estou contando isso a você. Gostaria de acreditar que estou no meio de um outro sonho, logo vou acordar e tudo voltará ao normal.
Ele agradeceu a bebida, retirou-se e voltou a mendigar nas ruas próximas. Eventualmente eu ainda o vi algumas vezes pelas redondezas do Veneza, mas com o tempo, não mais.
Anos depois soube que ele morreu em um abrigo para sem-tetos enquanto dormia. Ele foi encontrado com um sorriso no rosto e abraçado ao travesseiro.
Quero crer que ele encontrou novamente em seu sonho o amor da sua vida e dessa vez, finalmente pôde ser feliz.